quinta-feira, 1 de setembro de 2011

Il Colosseo e io


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Ontem foi um dia e tanto. Decidi ir a Roma sozinha. Daiana, uma brasileira fofíssima que está aqui há um ano, me fez uma merenda pra que eu não precisasse comer na rua e gastar meus muitos euros.

Um ônibus, um metrô, 1h e basta para chegar a sede do Antigo Império Romano. Fui contando as estações para não passar do ponto. Eram tantas e com nomes tão engraçados. De Agnanina a Otavviano são 21 estações. Deu pra observar muita coisa neste meio tempo.

Contastação mais importante: metrô é lugar de gente doida, aqui ou no Brasil. A diferença é que a gente doida daqui não fala português, e nem sempre italiano. Tirando o fato de que o trem é bonitão, novinho, bem limpo e organizado, o resto é igual, só que com uma boa pitada de diversidade cultural:

A doida que fala sozinha e faz caras e bocas e parece que está falando contigo, vestia uma daquelas roupas de alguma tribo africana e o que ela balbuciava e as vezes cantarolava era inintelígivel. Quem sabe alguma das milhares de línguas que existem na África.

O tio que grita com tudo que se mexe, mas com ninguém em especial, grita em italiano. Que esforço que fiz pra não fazer cara de apavorada.

E a dupla que pede esmola entra no metrô com uma caixa de som com rodinhas e um microfone. Muito moderno. É um espetáculo bonito de ser ver. Nada de “podia estar matando, podia estar roubando, mas estou aqui pedindo...” A primeira dupla deviam ser mãe e filha. A mãe cantava uma canção italiana e, eu acho que ela era do oriente médio, e a filha passava o copinho. Na viagem de volta, a dupla era de dois guris com uma gaita cada, estilo Dominguinhos, e o mais novo passava o copinho. Um detalhe interessante: o copinho das duas duplas era do MacDonald's. Me pareceu um símbolo do capitalismo.

As estações, na maioria, vendo-as de dentro do trem, eram bem bonitas, limpas e organizadas. Mas a estação terminal me decepcionou. Toda pichada, feia e mal cuidada. Na vigésima primeira eu saltei. Otavviano. Bonitinha. Quando voltei a superfície, estava em Roma. Munida de um mapa, parei na saída do acesso ao metrô e olhei em frente, meu primeiro destino era a Piazza San Pietro. Um ragazzo muito atencioso (e eu bem ligada) me perguntou se queria uma ajuda. Perguntei se pra chegar a Praça São Pedro era só seguir aquela rua reto e o guri: tu sei brasiliana oppure portuguesa? Pô, sacanagem, só porque na hora de falar dritto eu disse reto.

No caminho a Praça tem as mesmas coisas que no Brasil: camelôs, mendigos de pé torto, ou sem braço, ou bem velhinho pedindo dinheiro. Quem disse que na Europa não tem ambulante, mendigo e espertalhão? Mentiram pra mim. É verdade que eles falam inglês, francês e tantas outras línguas, mas continuam sendo mendigos, ambulantes e espertalhões.

Impressionante a quantidade de turistas. Ouvi tantos idiomas e vi tantas etnias diferentes que não poderia contar. Grupos de turistas, com sua guia e os radinhos pra acompanhar tudo o que ela dizia, lambuzados de protetor solar, enrolados em panos escrito: Italy/Roma. Coisa horrível. Adorei estar sozinha, podendo observar tudo ao meu tempo. Sem aquela loucura de consumir tudo que se ve pela frente. As pessoas mais interessadas nas vitrines e nos produtos dos ambulantes do que naquelas paredes seculares. Deu vontade de gritar: Alou pessoas, bugigangas tem em qualquer parte do mundo, história cada lugar tem a sua.

De repente, estava eu lá, no meio da Piazza San Pietro. De frente para as escadas que tem seus degraus construídos com pedras removidas do Colosseo, até que o tal Papa da época mandou parar, porque se deu conta que desse jeito, a Catedral acabaria com o monumento dos Imperadores Romanos. Muito sábio esse Papa. Não sei da onde tiraram o resto das pedras...

A praça é grande, tem duas fontes e ao lado de cada uma, uma pequena fonte com água que se pode tomar. Ela cai numa grande bacia de mármore, como se fosse uma bica. Juro que ouvi alguém dizendo: que pia bem grande (mas não identifiquei o brasileiro espirituoso). Eu ainda to com a minha garrafinha Fonte Ijuí que comprei no aeroporto com os últimos 4 reais que a mãe me deu justo pra isso. Enchi ela com a água do Papa. A água aqui da Itália é diferente. Gosto mais da do Brasil. Mas enfim, bebi água das fontes, várias vezes, sempre trocava a água da garrafa por uma mais fresca. Achei lindo isso.

Para entrar na Igreja tem uma fila monstra. É preciso passar pelo detector de metais. Ficar parado no sol. Ter paciência. Enquanto esperava observei aquelas colunas imensas que formam um semi círculo ao redor da Praça. E a parte externa da Igreja também é linda e cheia de detalhes. Sem falar nas pessoas. Observar pessoas sempre foi um prazer pra mim, mas assim com essa diversidade étnica, ficou ainda mais interessante.

Perguntei duas vezes aos guias e policiais se precisava pagar para entrar em alguma parte da Igreja. Não precisava. Primeira fila vencida. Achei um guarda-volumes, larguei minhas coisas e lá fui eu pra segunda fila. Enorme... na porta lateral da Igreja, mas do lado de dentro (como se fosse o hall de entrada, portanto sem sol). E no meio, tudo liberado. Alguma coisa me dizia que algo estava errado. Mas, fiquei ali. Quando, 30 minutos depois, cheguei no fim da fila descobri o que havia de errado: para chegar a cúpula da Igreja paga-se 5 euros pra subir os 300 e não sei quantos degraus ou 7 euros pra subir de elevador. Pô eu perguntei. Meus muitos euros estavam na mochila. Ok. Nem queria mesmo subir na cúpula e ver todo o panoroma de Roma. Deve ser bem feio.

Finalmente entrei na Igreja. Nossa. Uau. Fenomenal. Dei de cara com ela: Pietà. Ali. Há dois passos, com Cristo no colo, branca como uma nuvem. Divinal. É lindo. Perdi o fôlego.

E aqueles turistas malucos vá tirar fotos. Nessas horas fico orgulhosa de mim por não ter essa compulsão de ver tudo através de uma lente artficial só pra poder mostrar pros outros onde fui. Duvido que aquela gente toda, naquele desespero de achar o melhor ângulo, em algum momento parou e olhou pra ela. A mais bela obra de Michelangelo. Imóvel, esperando ser admirada. Como esse cara fez aquela escultura? Com tamanha perfeição. Parece que ele derreteu mármore e jogou sobre duas pessoas, para conseguir aquelas formas tão perfeitas.

No centro da igreja, em cada parede, a cada passo que se dá, impossível descrever o que se vê. É tudo de uma proporção colossal. De uma perfeição de formas. De uma beleza de cores. Eu nunca vi nada igual. Fiquei diante daquilo tudo tentando entender mas afinal, como é que aquela gente fez tudo isso. Sem tecnologia avançada. Sem misturador de cores automatizado. Como foi que penduraram aquelas estátuas imensas? Teoria da invasão extraterrestre?

Eu sei que o homem é capaz de tantas coisas, mas aquela igreja... É a expressão da capacidade criativa do homem. De toda a beleza que ele é capaz de construir. Não vou nem tentar descrever o que vi. Não seria possível.

Mas, me passou pela cabeça que em um lugar como aquele, não me senti, por nenhum momento na casa de Deus. Mas nem por um segundo. Na verdade me senti como num lugar frio e distante. Sem a possibilidade de tocar em nada. Era como quando criança que ia há algum lugar que me parecia tão lindo e cheio de coisas pra explorar e minha mãe me olhava severa e dizia pra não tocar em nada e me comportar.

Enquanto olhava toda aquela grandeza percebi que aquilo tudo foi construído para satisfazer o desejo de grandeza e megalomania do homem. Deus, segundo o que eu entendo por Deus, não precisa de tudo aquilo. Que me perdoem os que acreditam que Deus habita ali, mas não posso imaginar Deus em um lugar tão rico e frio. Cresci ouvindo que ele mora no meu coração, ali com certeza ele não ia querer morar.

Sai de dentro da Igreja e depois da Piazza San Pietro impressionada com que o homem é capaz de construir. Mas nem por um momento emocionada por ter estado na casa de Deus. Não me senti em sua presença nem pelo tempo de um suspiro.

Bom, eu queria ver o Colosseo. Tinha tanta coisa que eu ainda queria ver e enquanto me perguntava qual trajeto e que monumento escolheria, além do Colosseo, avistei aqueles ônibus de turismo, que nem o de Porto Alegre, e que o pessoal fica me zuando porque eu fiz o passeio. Pois bem, 12 euros e duas horas de giro por todos os lugares que queria ver e mais alguns. Ah, paguei. To na Europa. Falo italiano. Tinha só o resto da tarde para estar em Roma. Tenho euros. Fala sério. Adorei andar de ônibus turismo em Porto Alegre que eu já conhecia um pouco, imagina em Roma. E ainda poderia deixar brotar todas as caras de admirada e surpresa que sempre faço sem dar na pinta pros espertalhões que ficam de olho nos turistas bocabertas e desavisados.

Fui. Vi tudo. T U D O. Todas as belezas que Roma guarda nos seus 3 mil anos de história.

Queria poder descrever só um terço do que vi. E senti. E ouvi. Porque ainda tem o maravilhoso serviço de audioguida. Che bel giro che ho fatto! Mamma mia!

E de repente... ali, davanti a me, lui: Il Colosseo.

Eu fiquei de pé. Olhando fixo pra ele. Sem me mexer. Na minha cabeça todos aqueles personagens de filmes romanos e suas carruagens e suas sandálias e as folhas de louro atrás de suas orelhas e a audioguida disse: estamos passando pelas mesmas ruas onde passavam os grandes conquistadores do Império Romano. Falou do grande incêndio de algum ano que terminava com 64 sei lá se antes ou depois de Cristo e que quase destruiu a outra construção que se encontra com ele. E eu vi Nero e sua cara de louco espiando em uma das grandes colunas e todas aquelas ruínas e no alto um avião passando acima dele e as lágrimas rolaram pelas minhas bochechas.

Fui tomada por uma emoção que nunca havia sentido. Eu estava diante do Colosseo. Em cima de um ônibus aberto. Viajei no tempo.

Quando voltei a Piazza San Pietro, caminhava como se não pudesse comigo mesma. Os óculos escuros me ajudavam a disfarçar a perplexidade nos meus olhos. Não era capaz de ver mais nada. Nem a Fontana di Trevi que não se pode chegar de carro e eu queria tanto ver. Nada. Eu não poderia absorver nem mais uma informação. Estava cheia. Transbordando. Uma sensação de peso e de leveza ao mesmo tempo. Fui andando vagarosamente pela Via Otavviano, até o metro.

A caminhada me fez bem. Consegui relaxar. Comprei meu gelatto, sentei em um banco. Olhei pro céu e me dei conta que havia realizado mais dois grandes sonhos meus: estar diante do Colosseo e prendere un gelato seduta a un banco a Roma.

p.s. 1 meu cabelo está um espetáculo. Parece que vou ao cabeleireiro todo dia.
p.s. 2 as ambulâncias da Província de Roma parecem um Tarzan desesperado.
p.s. 3 diálogo com uma italiana:
  • Patricia, tu conhece, Brasília?
  • Sim, é linda. Adoro Brasília, é toda planejada, com muitos espaços vazios.
  • Deve ser muito moderna né?
  • Não, é velha, tem cinquenta anos.
    A italiana riu de mim. Depois do meu passeio em Roma entendi porquê.   

4 comentários:

Tiane Quadros disse...

Estava vendo aqui na minha lista de blogs o que havia de novo para ler e dei de cara com a sua postagem. Adorei! Parecia que eu estava te acompanhando no passeio por Roma! Aproveita aí, querida! No fim não combinamos aquele almoço antes da viagem,né (hehehe!) Mas longe ou perto a amizade permanece,viu? Beijos.

Renata disse...

Patrícia, muito bom o teu post. Bravissimo! Propriamente se sente o trajeto como se estivessemos a ver por teus olhos a Cidade Antiga. E o final do post: ficou genial!

Fabi disse...

Me senti na Itália, por breves 10 minutos.
Amiga querida, desfrute do velho mundo insanamente e me leva nessa viagem com vários outros posts como esse.

bjocas

Ana Baseggio disse...

Pati querida,
tu não tem preço ... estou muiiiito feliz por estarei aí e porque divides conosco toda essa grandeza do teu jeito de ser, este texto mostra muito bem a pessoa especial que és,
bj carinhoso e vamos te acompanhando por aqui